ANATOMIA DO POETA
... cabeça de nuvens
olhos de céu e negrume
boca de sorrisos e verbos
entre canções de amor
e dentes na carne fraca
a cada estaca no peito
um beijo desfeito
um grito insatisfeito
amordaçado às cordas vocais
há deuses demais
e glóbulos não tão vermelhos
há espelhos
e um infinito observar de formas
há normas
até para respirar
[sem ar]
cavar...
pulsar...
circulação de sonhos
pensamentos
questões sem tempo
cabelos ao vento
pêlos eretos
chorares concretos
restos deixados no prato
há seios e receios
há ventres férteis
na ânsia de procriar
[palavras]
há pernas ligeiras e mágoas
há tanto vazio transbordante
nas lágrimas vociferantes
falta o abrigo
colo receptivo
toque certeiro
apenas a mão aberta
a carícia, o desejo
as vísceras se aquietam
corpo do poeta
[deformado]
sem funções periféricas
volumoso coração
a mente, o momento
o sofrimento
há visão além da retina
um vício de ver o depois
ou o mínimo de ninguém
há as impressões nos dedos
as letras
que não são escritas
[ou lidas]
mas partes do todo
gen
cromossoma
soneto
feto expulso a termo
por não poder guardar
[em si]
a criação
como coisa de Deus
profanada aos poucos
pelos homens descrentes
da beleza do todo
o homem
o amor
o tempo
o poema
Lílian Maial
Rio, 05/08/01.
Lílian Maial
Enviado por Lílian Maial em 09/12/2005