Esplendor
Lílian Maial
De súbito,
o peso de anos, sobre o dorso,
se desfez.
Aquele incômodo,
fardo de Atlas,
rompeu as barreiras,
soltou as amarras,
cedeu resistências.
Ela voou.
Ali, naquele instante,
abriu suas asas douradas
(que sempre soubera recolhidas)
e encantou-se de sua liberdade.
Subiu no topo do mundo,
com o sorriso pleno dos deuses,
o rasgo fino da boca dos sábios,
e, diante do conhecimento de todas as verdades,
sentiu o alívio dos que se atrevem.
Ela voou.
E não foi em dor ou agonia,
mas numa estranha sensação
de arrogante alegria.
A mesma dos anjos idosos,
para quem o tempo parou de contar.
Ela voou,
artista principal de sua vida,
não regateou seu papel,
o palco era seu,
não aceitaria menos que o destino.
Então,
na consciência de lagarta
prestes a parir asas,
renegou o casulo
e pôs-se a sonhar mulher alada.
Voou.
E, no balé de suas plumas,
abanou certezas de segundo,
liquefez as pedras e as farpas,
derreteu a frieza dos homens,
sacudiu lembranças com o vento,
e lançou-se.
E o mundo todo,
lá de baixo,
não ousou fitar a libélula dourada,
espalhando lágrimas de purpurina,
pólen de saudade lagarta,
que não conseguiu amputar as próprias asas.
Nascera borboleta pronta,
e nunca poderia deixar-se morrer no casulo.
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*pintura de Tenini