Lílian Maial

Basta existir para ser completo - Fernando Pessoa

Meu Diário
11/12/2007 22h22
SE EU FOSSE PAPAI NOEL

Lílian Maial


Se eu fosse Papai Noel, começaria a repensar a história.
Não gostaria de ser velhinho, e muito menos bom. Hoje em dia os velhinhos não inspiram mais a confiança de outrora. Não há quem não faça uma piadinha sobre sentar no colo de Papai Noel.
O danado do velho leva a fama, que se agravou, decerto, depois do Viagra.
E, pior mesmo que tudo isso, é que não come. Ah, come rabanadas sim, mas com os olhos, porque a barba impecavelmente branca o denunciaria, caso comesse de verdade. E também, já está tão gordo, possivelmente hipertenso e dislipidêmico, quem sabe diabético insulino-dependente... Melhor um panetone light e um espumante diet.

Quanto a ser bom, num mundo abarrotado de violência, corrupção e indiferença, isso soaria, no mínimo, falso.
Papai Noel tem algo de satânico, a começar pelas vestes vermelhas. Ou de petista, não sei, talvez ambos.
Num calor de 40 graus, o cara só pode ter parte com o chifrudo, pra agüentar a sauna por dentro do traje.


E tem mais, não se consegue identificar o cidadão.
Quem sabe desenhar os traços de Papai Noel?
O danado dribla as 3 polícias (civil, militar, federal), o DETRAN (estaciona o trenó em qualquer canto), a fiscalização sanitária (nunca se viu um atestado de vacinação das renas contra a raiva) e a Interpol!!!
É, o cara viaja de um país ao outro sem passaporte, carregando um monte de muamba!!!

Portanto, nada de BOM velhinho.
Pra falar a verdade, nem se sabe se o cara é velho mesmo, já que nunca ninguém o vê.

Por isso, se eu fosse Papai Noel, eu seria mulher.
E nada de ser velhinha, que não dá IBOPE. Não vende. Tá mais do que provado que imagem comercial é de mulher nua ou semi-nua e cheia de silicone.
E nada de trajes quentes! Um top e um shortinho, pra facilitar as descidas por chaminés, e o coletinho básico à prova de balas.

Peraí, que chaminés? Qual é o brasileiro, pelo menos de cidade grande, que tem chaminé?
Não, eu entraria pela porta da frente, com um belo tapete vermelho, holofotes e purpurina mágica, liberada não sei de onde, ao chegar nas casas. Aproveitaria pra provar o peru, beber umas tacinhas de Moet Chandon ou Veuve Clicquot, saborear umas rabanadas de leite condensado e, quem sabe, ainda tirar um cochilinho entre uma casa e outra. Trocaria as renas por uma moto possante, que é menos afrescalhado, e os presentes, por cheque ao portador. Seria mais prático e tropical.

Pôxa, caramba, ficou uma droga esse Papai Noel!
DELETA!!!

Nada disso! Papai Noel é Papai Noel. Ninguém muda ou tira seu lugar. Pra falar a verdade, eu acredito nele.
Papai Noel fala comigo o ano todo, e esse papo se intensifica quando vai chegando dezembro.
Claro, dezembro é época de baçanço de vida, época de acabar algo e reiniciar outras coisas. Fazer planos, repensar a vida. E Papai Noel é isso, recomeço, esperança, a alegria de se acreditar.
Papai Noel é, acima de tudo, fé.

Por isso, acredito em Papai Noel e, se eu fosse ele, não deixaria morrer o Natal.
O que não falta é gente querendo matar o Natal. E já há tantas mortes por aí...

Decididamente não!
Se eu fosse Papai Noel, sairia em disparada com meu trenó carregado de fé, e a distribuiria por entre os homens descrentes, por entre os doentes crônicos, os velhinhos solitários, as mulheres submissas, o povo oprimido, os poetas inquietos (que não param de buscar), os líderes sem coragem, os homens sem honra e com teto, os homens com honra e sem teto, os irmãos.
Só não visitaria as crianças, porque seria perda de tempo, já que criança é a pura fé, que faz com que Papai Noel nunca venha a morrer em nossos corações.

Se eu fosse Papai Noel, eu me daria o mundo que existe dentro de mim.

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Publicado por Lílian Maial em 11/12/2007 às 22h22



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