21/12/2006 17h34
NATAL É TEMPO DE AMOR OU SOLIDÃO?
®Lílian Maial
Com a aproximação do Natal, as lojas cheias, as varandas enfeitadas, o clima de festa, a tendência é se pensar em união, família, ceia, amigos. Sempre fui muito festeira, e o Natal é a ocasião ideal para quem gosta de bagunça, de alegria, de casa cheia. De uns anos para cá, porém, venho acumulando perdas significativas dos meus amados, e o Natal vem ficando, a cada ano, mais desfalcado.
Curto muito os preparativos, as compras, a lista apertada de cada ano, a economia obrigatória, mas na véspera e no dia mesmo, me invade uma nostalgia, uma saudade, uma nuvem de tristeza que insiste em ocultar o sol da alegria.
Hoje me peguei pensando em como deve ser terrivelmente triste e solitário o Natal de quem ficou viúvo, ou de quem perdeu um filho, ou de quem viajou para o estrangeiro sozinho, ou de quem se aposentou e perdeu a convivência neurótico-deliciosa com colegas de trabalho, usuários de ônibus e metrô, e até das chefias mal-humoradas.
Imagino o Natal de quem sabe ser o seu último, ou de quem sabe ser o último junto à pessoa amada.
Calculo a solidão e a sensação de amputação e desamparo de quem acabou de se separar e ainda não reconstruiu um outro lar, ainda atordoado com a súbita mudança.
Penso nos Natais dos presidiários e suas famílias, nos dos órfãos, nos dos que vivem em instituições, nos dos hospitalizados, dos desabrigados.
Sei que Natal deveria representar o nascimento de Jesus, mas todos sabemos que é bem mais que isso, que existe todo um “merchandising” ao redor da data, estimulado pelo comércio e pela mídia, arrastando a sociedade nessa rede de consumo e obrigação de ser feliz.
Invariavelmente, no Natal, eu luto contra esse sentimento de saudade, mas ele me vence. E é uma saudade estranha, uma saudade de infância, uma saudade de sabores que nunca mais consegui reproduzir, uma saudade dos que já se foram e daqueles que nunca hei de conhecer. Uma saudade do que poderia ter sido minha vida e do que não foi. Uma saudade das tantas outras “eu” que não viveram, para dar lugar a esta que aqui está. Não que esta não merecesse ter-se sobressaído, mas as escolhas implicam em perdas, e é a saudade dessas perdas que me assombram no Natal.
No fundo, penso que o Natal me chame à atenção, mais que o aniversário, quanto à passagem do tempo. É quando os nossos mortos se acumulam à mesa da ceia e em nossos corações, até no simples gesto de cortar o peru, ou de distribuir os presentes sob a árvore.
Ou talvez, quem sabe, toda essa tristeza seja por ver que até o Roberto Carlos da minha infância envelheceu, e que já não provoca o delírio de outrora.
Não sei, só sei que o Natal não é só tempo de amor não, é tempo também de solidão. Uma solidão que pode acontecer em meio a uma multidão. Solidão dos outros de nós mesmos.
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Publicado por Lílian Maial em 21/12/2006 às 17h34