11/11/2010 21h15
ESTAMOS ENVELHECENDO
®Lílian Maial
Faço parte de um grupo de amigas dos tempos de colégio, que celebrou um reencontro depois de muitos anos sem notícias umas das outras. Trocamos e-mails, opiniões, experiências e afetos. Rola um carinho muito grande e, eventualmente, quando entra alguma nova/antiga amiga, há toda uma expectativa quanto ao primeiro encontro nesse reencontro.
Hoje, uma delas – que curiosamente faz aniversário – colocou, em resposta às felicitações pela passagem do natalício, uma observação que me deixou pensativa, uma vez que estamos todas na mesma faixa etária e, por conseguinte, amealhando as mesmas alegrias e aflições. Ela estava receosa de nos decepcionar, num próximo encontro, e comentou que, embora tivesse vivido em diferentes lugares, alguns bem exóticos, e tido a coragem de deixar um bom emprego para se aventurar novamente na vida acadêmica, estava evidente que já estava “passadinha” para um bom emprego quando a aventura terminasse. Comentou da insegurança e do medo de não vir a ter uma vida que valesse a pena ser vivida.
Naturalmente, diante de um relato tão pungente, choveram mensagens de otimismo, de incentivo e de conforto. Fiquei martelando uma idéia: existe alguma vida que não valha a pena ser vivida?
Pesquei umas citações sobre o envelhecimento, mas houve uma frase, em especial, que me mostrou algo que sempre soube: tudo, então, vai depender dos poemas que estão guardados na alma.Tratava-se da menção do evangelista João: “... e o Poema se faz carne”.
Mas é tão difícil, no dia-a-dia, fazer poesia! Aí vem o Rubem Alves e me diz que “A alma é guerreira: Pugno, ergo sum – luto, logo existo.”
E é exatamente isto: a luta! O que mantém a juventude da alma é a luta! Quando uma pessoa desiste de lutar, tenha a idade que tiver, ela envelhece; na verdade, fenece, como uma flor. Em todos os dias é necessário que se vença os desafios.
Quando se é criança e adolescente, a batalha é pelas notas, pela aprovação na escola, na faculdade. Mais tarde, por um lugar ao sol, um emprego, constituir família, encontrar o par ideal. Depois, a preocupação com os filhos, sua criação, sua formação, sua partida de casa, para formarem as famílias deles. Vem a preocupação com os pais, já idosos, até sua partida. A insegurança da convivência com o silêncio, com o eco da própria voz, muitas vezes as separações, o fim de casamentos, aliados às mudanças orgânicas que acompanham a inevitável e ultrapassada menopausa (démodé, mesmo).
Nossa! Como somos guerreiras! Como somos fortes e determinadas, em nossa feminilidade, maternidade e espiritualidade! Estudar, crescer, casar, ter uma carreira, isso é fácil para qualquer um. Mas fazer tudo isso e ainda ser o motor da família, o ponto de equilíbrio, o jeito para tudo, mais ainda, viver o poema... Uau! Estou admirada comigo mesma da nossa capacidade de poetizar a vida!
Minha amiga, o que posso lhe dizer? Sim, envelhecemos. É uma verdade inexorável. É uma droga! Uma lástima não ter mais o mesmo contorno dos 20 anos, ter de disfarçar o indisfarçável, conviver com os animais e frutas do tempo: pés-de-galinha, papada de pelicano, perna de casca de laranja, barriga de vaca, cabelo de palha de milho, ufa! Mas, pense bem, sabíamos disso desde a assinatura do contrato da vida. O cartório do destino reconheceu firma e tudo! Não tem como tentar mudar depois. Nascemos e, então, concordamos com tudo isso. E vivemos, não vivemos? Não tivemos todos os benefícios dos 5 anos, dos 10 anos, dos 15, dos 20, 30, 40? Até que dá pra driblar aqui e ali, mas, de maneira geral, não tem volta...
Agora, é bobagem retroceder. O negócio é ir adiante e descobrir o que ainda há por vir. Qual a aventura de amanhã? Qual o desafio que a guerreira vai enfrentar, dessa vez? Luto, logo existo. Isso não quer calar dentro de mim.
Quando eu bem imaginava que me aposentaria e teria uma vida calma, junto à família, numa casinha de campo ou de praia, de repente, a essa altura do campeonato, me vi precisando arranjar mais um emprego, por conta de um divórcio tardio e por ter que cuidar de minha mãe, que, independente que sempre foi, nunca imaginou que fosse algum dia precisar de mim. A grana não dava, tive que ir à luta, me virar! Lutar, amiga, lutar!
É, a vida dá voltas e mais voltas, e nos envolve, emaranha, deixa tudo de ponta-cabeça, da noite para o dia. As certezas são tão incertas, quanto os amanheceres (essa eu inventei agora). E é maravilhoso que seja assim,não? Já pensou ter a certeza da vida formatadinha? O fim chegando e você parada, esperando?
Então, minha amiga – que essa crônica é pra você – é arregaçar as mangas, sem vergonha do estado do braço, porque esses braços são fortes e sustentariam pilares, se preciso fosse. Vamos à luta, porque existimos. Vamos à luta, porque estamos todas no mesmo barco. Vamos à luta, porque juntas o fardo é menor e é comum a todas, e nos torna mais íntimas do que nunca. Vamos à luta, porque é da nossa natureza. Porque somos a única razão de merecer a vitória.
Estamos envelhecendo, é certo, como é certo que em algum dia não estaremos mais por aqui. E o que é que marca a existência de uma pessoa: as facilidades ou as lutas que teve de vencer? Os ícones mundiais são famosos por seus feitos, por suas lutas e conquistas e, geralmente, já na terceira idade. Então, vamos aproveitar bem a segunda idade e, como Scarlett O’Hara, de “E o Vento Levou...”: vamos pensar nisso amanhã.
Beijo da amiga,
Lílian Maial
Publicado por Lílian Maial em 11/11/2010 às 21h15