SINESTESIA
®Lílian Maial
Não adiantava fugir. Não havia caminho. Estava impregnado do gosto, do cheiro, dela. Ele a conheceu, a descobriu, a possuiu e a incorporou. Desde então, o leve balbuciar de seu nome despertava as mais inusitadas percepções. Passou a entender a dependência. Ela era alucinógena.
Ouvia seu nome e, imediatamente, sentia seu gosto na boca. O gosto molhado de todas as suas bocas. Comia de tudo, desde sal, pimenta, alho, mas nada tirava aquele gosto de entrega, de prisão, de morte.
Era ler seu nome em qualquer mísero pedaço de papel, que lá vinha o cheiro da pele, aquele cheiro agridoce, feito umami fabricado no inferno.
Era ler aquelas letras e ser atormentado pelo olfato deliciosamente torturante de seus poros alargados orvalhando delírio.
Ela era vermelhamente doce. Verdejantemente melódica. Amarelamente quente. Purpuramente cheirosa. Era um arco-íris de sons inebriantes, ruídos de mar e vento, sussurros de vinhas.
De nada valia amaldiçoá-la. Ela habitava a profundeza de seus neurônios, era um vírus ardente, desses que se pega uma vez na vida e não tem cura. Coisa ruim, que não se quer que acabe.
Parece que some, mas basta tocar aquela música, que as chamas das velas todas se acendem, e o aroma almiscarado de seu hálito se espalha no sabor da carne macia. Seus dedos de farpas douradas arranham e acariciam, assim como seus olhos de deserto e sede.
Havia desistido de tentar esquecê-la. A cada tentativa de não lembrar seu nome, ela lhe sorria cúmplice, exalando azuis.
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