26/04/2009 23h02
TEMPO
Tempo
®Lílian Maial
Existe essa compulsão universal, essa quase obrigação de se fazer sempre alguma coisa, de se “aproveitar o tempo”.
Há tempo para tudo, menos para ter tempo.
Tem dias que eu simplesmente não quero fazer nada com meu tempo, apenas não dar bola para ele, deixar que passe, enquanto não faço absolutamente nada. Nada mesmo. Sequer penso. Me esqueço de qualquer coisa que possa me lembrar qualquer atividade ou preocupação.
Antes, quando mais novinha, eu ficava sozinha no quarto e me desligava do mundo lá de fora, me concentrando no daqui de dentro. E pensava, colocava as ideias (agora sem acento) em ordem, articulava esquemas para a semana, de forma que não faltasse tempo e que nada ficasse sem a devida atenção. Eu gastava o meu tempo livre pensando no tempo! Ele sempre me fascinou. Passei anos da minha vida, quiçá décadas, intrigada com sua passagem e as transformações pelas quais passamos.
Quando se é muito jovem, o tempo não preocupa tanto, não costumamos pensar nele. Eu já pensava, porque não entendia direito o que, afinal, eu fazia neste mundo. Por que vim? De onde vim? Sou só isso ou tudo isso?
Mais tarde, quando nos sobrevêm as primeiras perdas, começamos a pensar mais demoradamente no tempo, no tempo que ainda teremos com nossos familiares, amigos, tempo de programar a vida (não é estranho?), de alcançar o sucesso, de chegar no futuro. E esquecemos do mais importante: não existe futuro. O futuro de todos é o fim. Não há escapatória, e talvez não haja, mesmo, do que escapar. Pode haver disfarces, subterfúgios, outra vida, alma eterna, tudo bem, que seja! Mas a vida que conhecemos, a pessoa que somos, no corpo que vemos todos os dias, essa acaba quando o organismo se deteriora. É inexorável. E não se trata de credo (ou falta dele), de cor de pele, de poder aquisitivo, de idioma, de iluminação. Trata-se de princípio e fim.
Portanto, o tempo que temos e conhecemos nada mais é do que um hiato entre o início e o final. Perdemos muito tempo tentando driblar o tempo, ao invés de relaxar e observar o que nos cerca, e de viver.
Não dá. Já tentei. No fundo, passamos a vida querendo segurar o tempo de alguma forma, prolongando ao máximo a juventude, criando métodos, treinando a memória, gastando fortunas em cremes, medicamentos e terapias.
Se colocarmos a lógica para funcionar, o ser humano não foi projetado para durar mais de 40 anos (e olha que é chão...). Qualquer tempo depois disso é lucro (ou um terrível prejuízo, porque é justamente a partir daí que vem esse frisson de frear o tempo).
A Medicina evolui, mas a Natureza é maior. Logo chegam novos vírus, novas catástrofes, guerras, devastações. Homem lutando contra homem, no lugar de festejarem - juntos - o tempo que ainda têm.
Dia desses cheguei a pensar que os artistas, de maneira geral, têm a necessidade desesperada de sobrepujar o tempo, deixando sua arte impressa em livros, em discos, em esculturas, pinturas, filmes. O poeta se eterniza em versos. A palavra – tijolinho da comunicação – vence o tempo, na medida em que perpetua um nome, uma pessoa, uma obra.
É, artistas vencem o tempo. E o que seria dos artistas, se não houvesse o público? Então é o público, o cidadão comum quem perpetua o artista e, destarte, vence o tempo.
É tempo de parar por aqui. Tô com sono.
Boa noite!
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Publicado por Lílian Maial em 26/04/2009 às 23h02