10/08/2008 17h44
A UM CERTO PAI...
®Lílian Maial
Naquele Domingo, sozinha em casa, recebi o telefonema que selaria meu destino, ou melhor, nosso destino:
-“Está sentada, minha gata?” – disse aquela voz trêmula e assustada.
-“Estou, por quê? Fala logo!” – eu estava mais ansiosa ainda.
-“Estamos grávidos!!!” – a palavra saiu entre gritada, chorada, gargalhada.
A partir daquele dia, sabia que ele seria um PAI. Não um pai, mas um PAI. E foi. E é.
Isso me reporta à minha infância, quando mal via meu pai, quase nunca podia sentir-lhe os afagos, pois nossa vida sempre fora dura e ele trabalhava desde cedinho até o fim da noite.
Quando mais velha, já na puberdade, fazia um esforço e conseguia ficar acordada e esperá-lo voltar para casa, e, apesar do sacrifício por acordar bem cedo, sempre valia a pena.
A partir dali, nossa relação cresceu a cada dia, e tornamo-nos grandes e verdadeiros amigos, a ponto de não precisarmos usar palavras para entendermos o que se passava com um e outro.
Voltando ao pai dos meus filhos, percebo que eles têm com ele uma relação muito parecida com a minha e de meu pai.
Não posso esquecer aquela frase: “estamos grávidos”. E ficamos grávidos juntos, certamente. Naquela ocasião, éramos residentes, ambos médicos formados dois anos antes, com infinitos sonhos e uma ideologia.
A vinda do bebê era cercada de expectativa, não só por nós, mas por toda a família, onde não havia crianças. E aquele pai não me deixou só um instante sequer, fazia questão de acompanhar todas as consultas do pré-natal, inclusive ocupando mais o obstetra do que eu ou o bebê. Eram 25 minutos com o pai e apenas 05 com a mãe e o concepto. Na saída, invariavelmente, uma taça de “banana split” no Café Palheta, dividida por 03 (eu, ele e a porção do bebê, que eu avidamente devorava).
E assim, os meses foram passando, a barriguinha crescendo, até que o nosso nenê começou a dar o ar da graça e a se mexer. Chutava, espremia minhas costelas, fazia cócegas com seu pezinho, que eu conseguia agarrar e prender por alguns segundos.
O pai curtia olhar para meu corpo nu, delimitar o que era eu e o que era bebê, acariciar os contornos ainda encobertos pela barriga, manter contato com aquele serzinho intrometido e tão querido.
E então chegou o trabalho de parto, adiantado numas 02 semanas, pegando a gente meio de surpresa, eu fazendo as unhas no salão, ele esperando embaixo. Veio aquela sensação esquisita, aquela pressão. E ele me dizia que eu era abusada, que deveria ficar deitada nesses últimos dias. Mas quem me convenceria a sossegar?
Fomos para casa e ainda tomamos banho e jantamos na minha sogra.
O pai queria que eu fosse logo para o hospital.
O obstetra não chegava em casa (naquela época, ainda não havia celular, mas nós já o tínhamos “bipado” uma dezena de vezes).
Umas 03 horas mais tarde, já com a tal dorzinha apertando, o médico resolve verificar o “alarme falso” que não cedia com “Espasmo-Plus” e nem “Espasmo-Cibalena”. Quando ele deu o toque, já estava com 04cm de dilatação e foi aquela correria.
O pai foi para a sala de parto, parto esse que acabou complicando, resultando numa cesariana e, por incrível que pareça, foi quem salvou nossas vidas. Eu tive uma complicação obstétrica chamada distócia uterina e, como estavam todos atentos ao nascimento do bebê (que estava em sofrimento fetal), não repararam que eu tive uma raque total, com iminente parada respiratória. Não fosse meu marido se preocupar tanto conosco e perceber que eu estava sem proferir palavra e com os olhos arregalados, e essa escritora não teria nunca mais o que dizer...
Felizmente o bebê nasceu bem, hoje é um robusto e saudável estudante. A mamãe saiu daquela ilesa, embora um tanto assustada, mas com a segurança e o carinho do pai, que não se cansava de namorar o filho, desde aquele 12 de outubro, até os dias de hoje. Seus olhos passam mais que amor, passam a certeza da obra prima, o orgulho, a confiança, o carinho, a mão sempre estendida.
Além desse bebê, tivemos uma garotinha linda, de quem o apoio, a torcida e gravidez ele nunca deixou de compartilhar. Ela foi a princesinha daquele jovem pai, a quem ajudou a se firmar na vida. Ele agora era mais adulto, mais consciente, mais seguro de seu papel na criação daquela vidinha.
Alguns anos depois, quase oito, para nossa surpresa, veio o caçula, contrariando todos os métodos anticoncepcionais, mostrando que tinha uma personalidade que nem a ciência explicava. Ele foi um presente, que trouxe a esperança e a juventude de volta aos nossos corações.
Apesar de não ter mais a disponibilidade de tempo que tivera outrora, como com os outros 02 rebentos, o pai nunca deixou de estar grávido junto, de presenciar a primeira ultrassonografia, de dividir o espaço da visão da televisão, de ter desejos alimentares esquisitos, de levantar na madrugada e nos cobrir de edredom e beijos.
Está certo, é para mim que a escola liga quando algum deles se machuca, é para mim que vem o primeiro sorriso, quando eles vencem ou se dão bem em alguma coisa, mas é para ele que vai meu pensamento, quando preciso exercer a responsabilidade de cuidar deles, de passar a diferença entre o bem e o mal, de dar exemplo de caráter, companheirismo, amor e confiança. E é para esse pai, como a todos os outros, que desejo um Feliz Dia dos Pais!
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Publicado por Lílian Maial em 10/08/2008 às 17h44