Lílian Maial

Basta existir para ser completo - Fernando Pessoa

Meu Diário
15/01/2011 17h18
DEPOIS DA TEMPESTADE, O CAOS
®Lílian Maial


 
Acabei de receber o impressionante depoimento de uma moradora de Teresópolis - uma das cidades da região serrana do Rio de Janeiro, castigada pelas chuvas do início da semana.

Eu, que já vinha sofrendo com a falta de notícias de amigos chegados, fiquei mortificada com o relato dessa mulher, tão aflito e desolador.

Normalmente nos comovemos com as águas violentas arrastando carros, móveis, casa e pessoas. Sofremos com o número de mortos e com os objetos pessoais, colecionados durante toda uma vida, com sacrifício, perdidos num único dia.

No entanto, poucos fazem ideia do que acontece em seguida: falta de luz (que implica em falta de geladeira ou freezer e a perda de tudo o que lá existia), de telefone (inclusive celular, pois a bateria não tem como ser recarregada), de internet, ou seja, falta de comunicação. As pessoas estão sem água (cortado o abastecimento pelo risco de contaminação dos corpos dentro dos rios), e sem comida (uma vez que a produção foi destruída) e as estradas não estão dando acesso para a chegada de caminhões de abastecimento dos supermercados.

A maioria dos moradores deixa suas casas a pé, pois as águas e a lama varreram tudo o que havia dentro delas, incluindo os carros, e se deparam com o horror: lama, fedor e devastação em cada esquina!

Há o cheiro insuportável dos corpos em putrefação, que chegam em caminhões, cerca de 60 a 80 por vez, ou levados pelos moradores que ainda possuem carro.

Nas ruas, corpos amontoados ou sob escombros inalcançáveis. Desfilam pés, braços e partes de corpos mutilados pela violência da correnteza, corpos passam boiando pelos rios.

É como um êxodo de guerra: helicópteros de todas as cores cruzando os céus às dezenas, sirenes a noite inteira, bandos de pessoas, sempre em silêncio absoluto, carregando suas crianças e seus parcos pertences, vergados sob o peso do que era possível carregar nas costas. Todos de cenhos franzidos, em estado de choque, passos arrastados, com histórias para contar de terrores inimagináveis.

Nas casas, a lama contaminada provoca diarréia e outros sintomas. E ainda há o perigo de todo o tipo de doenças. Muitos animais domésticos ficaram para trás, em casas abandonadas, sem comida ou água, ou no alto das ribanceiras despencadas, andando de um lado para outro, em desespero, sem conseguir descer.

Os poucos moradores que conseguem levar seus animais, quando chegam aos locais onde são recolhidos pela Defesa Civil, têm que deixá-los, pois não podem levá-los para os abrigos. Eles são, então, abandonados às dezenas, vagando pelas ruas, sem socorro, e certamente disputarão qualquer possível alimento com violência.

O pior do ser humano, infelizmente, também aflora nessas horas e as cidades estão sendo saqueadas, com pedestres apanhando nas ruas.

Mas há o outro lado, com o trabalho incansável e incessante das equipes de todas as procedências, trabalhando madrugadas adentro, no breu, na chuva, no risco. São os que liberam estradas, recolocam postes, levam e buscam moradores, doações, resgatam, tratam, socorrem. Não é um perfil de trabalho, mas de uma missão sem interrupção, enquanto não estiver concluída.

São repórteres chorando em frente às câmeras, por não suportarem a visão do que é indescritível.

E começa a faltar de tudo! Além de todo o básico, faltam: velas, fósforos, pilhas de todos os tamanhos, lanternas, pasta de dente, fraldas, absorventes femininos, medicamentos.

As prefeituras se mobilizam e compram todo o estoque das farmácias, mas, mesmo assim, não dão conta.

O mais necessário é água, muita água, muita água, muita água!

E já existem casos de leptospirose e de tétano, e o número vai aumentar exponencialmente nos próximos dias, pelo tempo de incubação. A população de ratos já nem se esconde mais, nestes locais mais atingidos: já fazem parte do cenário de caos. E os hospitais que ainda estão de pé, não têm leitos suficientes para a quantidade de doentes e acidentados que chega a cada minuto.

Tem chovido intermitentemente, embora não tão forte, mas as próximas previsões são assustadoras. O céu continua carregado. A alma também.

Há muito que fazer. Vamos começar.

 
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 Veja como ajudar as vítimas das chuvas na Região Serrana do RJ
Locais que estão recebendo doações:

Cruz Vermelha - Praça da Cruz Vermelha, 10 – Centro do Rio.
Estão sendo arrecadados: água mineral, alimentos de pronto consumo (massas e sopas desidratadas, biscoitos, cereais), leite em pó, colchões, roupa de cama e banho e cobertores.

Prefeitura de Petrópolis – Igreja Wesleyana; Igreja de Santa Luzia; Sede da Secretaria de Trabalho, Ação Social e Cidadania.
Os três postos arrecadam doações de água, colchões e materiais de limpeza e higiene pessoal.

Prefeitura de Teresópolis – Ginásio Pedrão – Rua Tenente Luiz Meirelles, 211 – Várzea.

Estão sendo arrecadados: água, alimentos, roupas, cobertores, colchonetes e itens de higiene pessoal.

Uma conta corrente também recebe doações para ajudar as famílias atingidas pelo temporal.

Nome da conta: "SOS Teresópolis - donativos".
Agência: 0741 (Banco do Brasil) – Conta: 110000-9.

Rodovia BR-040 - Concer - Praças de pedágio da BR-040 situadas em Duque de Caxias (km 104), Areal (km 45) e Simão Pereira (km 816), além da sede da empresa (km 110/JF, em Caxias).

A Concer pede que seja doado, preferencialmente, água mineral, produtos de higiene pessoal e de limpeza, roupas de cama, mesa e banho, além de colchonetes. Nas praças de pedágio, as doações podem ser entregues nos postos do serviço de informação ao usuário da rodovia, que funcionam de segunda a segunda, 24 horas por dia.

Hemorio – Rua Frei Caneca, 8 – Centro do Rio – Das 7h às 18h.
O Hemorio pede que as pessoas doem sangue para as vítimas das chuvas. Os estoques estão quase zerados. Friburgo e Teresópolis solicitaram 300 bolsas, mas o Hemorio não tem como atender.

Pode doar sangue quem tiver entre 18 e 65 anos, mais de 50 quilos e estiver bem de saúde. Basta levar um documento oficial de identidade com foto.
Informações e agendamento pelo disque sangue 0800-282-0708.

Supermercados – Grupo Pão de Açúcar
Postos de coleta foram montados pela empresa em todas as suas 100 lojas das redes Pão de Açúcar, ABC Comprebem, Sendas, Extra e Assaí, em todo o estado Rio de Janeiro para que os clientes possam cooperar com doações de alimentos não perecíveis, roupas e cobertores. A ação acontece até o dia 26 de janeiro.

Polícia Rodoviária Federal - Ver postos abaixo.
Maior necessidade é por água, leite em pó, materiais de higiene e limpeza e colchões.

Postos da PRF que receberão doações:
BR-116: KM 133 (Doações 24 horas)
BR-101: KM 269 (Doações 24 horas)
BR-040: KM 109 (Doações das 8h às 17h)
BR-116: KM 227 (Doações das 8h às 17h)

Rodoviária Novo Rio - Avenida Francisco Bicalho, 1 - Santo Cristo.
A Rodoviária Novo Rio recebe doações para a Cruz Vermelha. Os donativos são recebidos no embarque inferior, das 9 às 17 horas.

Polícia Militar - Todos os batalhões da Polícia Militar do estado serão centros de recepção de doações.
Comandantes dos batalhões recomendam que seja doada água mineral, alimentos não perecíveis e materiais de higiene pessoal.
 


Publicado por Lílian Maial em 15/01/2011 às 17h18
 
14/01/2011 16h57
O CHORO DA SERRA
O CHORO DA SERRA
®Lílian Maial
 


Aprendi a gostar de finais de semana quando ia com meus pais, bem pequena, ao Museu Imperial, em Petrópolis, e deslizava com aquelas pantufas enormes, encantada com o luxo e a exuberância da corte portuguesa na terra brasilis.

Aprendi o que era o lado direito e esquerdo na casa de Santos Dummont, nos degraus da escada de um pé de cada vez, e a ver as horas no Relógio das Flores, em Petrópolis, e a me imaginar princesa, em valsas intermináveis, no Palácio de Cristal.

Aprendi a dar o primeiro ponto de sutura num hospital, em Teresópolis, sob a orientação do Dedo de Deus, que me trazia alumbramento.

Aprendi a guardar lembranças e sabores da padaria da rua principal do Alto de Teresópolis.

Aprendi sobre vento, árvores, pássaros, um friozinho gostoso e muita paz, em Nova Friburgo.

Aprendi a gostar de comida alemã e a entender que suspiro não era só doce de clara de ovo e açúcar, mas que era também o nome da praça principal, onde se provava qualidade de vida.

Aprendi que viajar para a região serrana era uma forma de apreciar a Mãe Natureza, em sua majestade, do meu Rio de Janeiro.

Sou tão pequena para entender a Grande Mãe! Tanta água, tanta força, tanta dor...

Não aprendi a desapegar das humanidades todas.

Não aprendi a deixar de sofrer pelos que tudo perdem.

Não aprendi a desaprender.

Hoje, mais água inunda o peito, infiltra o coração e desaba em sal e desolação, soterrando o sorriso e deixando a poesia em escombros.

Sou pequena diante da Grande Mãe, mas me fundo aos que lamentam seus filhos, amaldiçoam as águas furiosas e as irresponsabilidades todas. Construir sem destruir.

Grito um grito de indignação e impotência.

Choro com saudade da infância. Visto minha alma de luto e vontade. Elevo uma prece de resgatar coragem. E entoo uma canção de reerguer mais um dia.
 
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Publicado por Lílian Maial em 14/01/2011 às 16h57
 
10/01/2011 19h12
MARCELA TEMER

Acabei de ler e comentar um texto muito bem escrito, da jornalista Malu Fontes, doutora em Comunicação e Cultura, professora da Facom-UFBA, diretamente do blog Literácia, quando ela comentava acerca da personagem feminina que mais chamou a atenção dos meios de comunicação, desde a posse da primeira mulher brasileira eleita para a Presidência da República - Dilma Roussef.

Ela se referia a MarcelaTemer, mulher de 27 anos, jovem, bonita, formada em Direito e casada com o vice-presidente da República, Michel Temer, homem de 70 anos, o que provocou grande "furor" na mídia e nos sítios de relacionamento.

Houve comentário de todos os lados, pelo fato de ser Marcela uma ex-miss, e da diferença de 43 anos entre ela e o Michel.

É natural que haja uma série de comentários sobre a vice-primeira dama, inclusive alguns com tom bastante grosseiro, tanto proferidos por homens, quanto por mulheres, de todas as idades e classes sociais. Já ouvimos alguns interessantes, até comparando Marcela com a princesa Diana.

Sabe-se que a moça, quando se casou com o Temer, contava com 20 anos, ele com 63 anos, então deputado federal. Há 2 anos tiveram um filho. O que todos se perguntam é se ela teria se casado com ele, se fosse um "joão-ninguém".  Isso ninguém nunca vai saber.

O que se conhece é a discrição da moça, sua elegância e porte, e uma chuva de especulações da pior espécie.

A jornalista Malu Fontes comentou que "as mulheres não perdoam Marcela por ela ser jovem, bela e casada com um homem poderoso". Discorre sobre o caso como se se tratasse de inveja. Não sei se é só isso, ou, até mesmo, se é isso. Acredito, inclusive, que tal abordagem seja um tanto superficial. A raiz é muito mais profunda.

A grande mágoa das mulheres é a certeza de que, se fosse o inverso, a mulher setentona seria apedrejada em praça pública pela mídia, receberia a alcunha de ridícula, esclerosada, e outros adjetivos menos educados, de todos e cada um dos brasileiros e brasileiras.

As brasileiras estão acostumadas à beleza das suas estrelas de cinema, teatro e televisão, muitas com idade já avançada, e não se magoariam com a beleza da Marcela.

O que incomoda é o atraso do feminismo no Brasil, e a Marcela simplesmente tornou isso evidente, justo na festa feminina, por ver a primeira mulher subindo a rampa do Planalto.

O que magoa é saber que, caso Dilma Roussef optasse por desposar um homem de 25 anos, seria crucificada por cada vivente deste planeta chamado Brasil.

O preconceito contra a mulher alcança nuanças insuspeitadas, disfarçado de um tal senso moral duvidoso e tendencioso.

Marcela que viva sua vida, que ajude (ou não) seu marido a desempenhar seu papel na política do nosso país, e que seja feliz!

Quanto a nós, mulheres e homens, que entendamos que cada um sabe o que é melhor para sua vida, e que a escolha, num país livre, é direito de cada cidadão.

Vamos aguardar para ver se surge um "primeiro-damo" de 25 anos...


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Publicado por Lílian Maial em 10/01/2011 às 19h12
 
25/12/2010 14h58
HOJE É NATAL
HOJE É NATAL
®Lílian Maial
 



Feriado.

Dia de contabilizar suicídios, overdoses e infelizes.

Todo mundo desejando ao outro “Feliz Natal”. Mas o que significa isso? Por que você deseja isso a alguém? O que você quer dizer?

Quantas vezes ouvi mos “Feliz Natal” de quem não está nem aí para nós o ano todo?

Quantos, de quem queríamos apenas um abraço, o calor humano, num dia qualquer, sequer lembram que existimos, ou nos desejam sucesso e paz? E como ter paz, quando ela depende justamente do outro e de suas atitudes e decisões? Como ter sucesso, se todos os sonhos se desmoronam com a maldade, a crueldade e a indiferença de quem já foi tudo?

O que se fez do Natal? Uma compra e venda de afeto. Uma frase mágica, que apaga toda a infelicidade do mundo. Uma festa cristã com sentimentos marqueteiros.
Quantas “lembrancinhas” obrigatórias, que em nada combinam conosco, e que temos de retribuir, sem a menor vontade?

Hoje é Natal.

Data a que se atribui o nascimento de Jesus, homem que pregou a igualdade entre os homens e que virou símbolo de bondade, altruísmo e amor ao próximo, coisas bem diferentes do que se vê nos dias de hoje, onde o consumo mandatório tomou conta das mentes e nublou corações de conceitos inadequados e imprecisos.

Natal virou festa burguesa de importação de valores que não são nossos. Não temos neve, não temos vestimentas pesadas, não temos as frutas típicas, nem as canções originais. Tudo vem de fora. E, no afã da fantasia americanizada (pois até as roupas de Papai Noel vieram da propaganda da Coca-Cola), esquecemos da nossa realidade, nossa cultura vasta e linda e da nossa gente, que em sua maioria não tem nem arroz com feijão, muito menos peru e presentes. O que teriam para celebrar?

Num país como o nosso, com sérios problemas sociais, essas festas soam, no mínimo, como desrespeito. E todos embarcamos nessa cegueira colorida e sonorizada, enfeitada de lembranças de infância e de mortos queridos, tampando o sol com a peneira da indiferença.

É! Hoje é Natal.

E me veio esse horror à hipocrisia, à obrigação de agradecer pelo que não vem do coração, à consciência de que, por um dia apenas, todo o comércio e o movimento da cidade fica caótico, estimulando a desigualdade, a revolta e a infelicidade de muitos - preceitos absolutamente opostos à pregação cristã.

Hoje é Natal. Na minha casa, na sua, nos hospitais, presídios, favelas, na caatinga, no sertão, nas palafitas, nas pontes que abrigam os desabrigados, nos pontos de venda de drogas, nas sarjetas e nas lavouras.

Hoje é Natal e você tem comida, tem Roberto Carlos na praia de Copacabana, tem gargalhadas alcoólicas, tem presentes e palavras ensaiadas. Mas será que temos verdadeiramente o Natal no coração?

 
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Publicado por Lílian Maial em 25/12/2010 às 14h58
 
23/12/2010 21h54
DEFINIÇÃO DE AMOR - Carta para Lucilaine
DEFINIÇÃO DE AMOR
®Lílian Maial
 
 
“Lembra quando esteve aqui no meu apartamento e falou um tantão de coisa? Uma eu não esqueço: esse armário de casal é só seu, logo estará preenchido do outro lado. Acertou! Tudo passa. Só que perdi a definição de amor”. 
                                                                                               Lucilaine
 

Perder a definição de amor soa como uma coisa grave.

Mas qual seria a definição de amor?

Seria algo envolto em inocência, com promessa de eternidade, passando pelo crescimento, pela construção de um futuro e um “colher frutos” juntos?

Seria a incondicionalidade do sentimento, com a necessidade de cuidado, de compartilhamento e cumplicidade?

Seria o depositar da esperança, numa conta conjunta de confiança com o outro?

Seria a entrega de todos os sonhos, esparramados aos pés da pessoa amada, contando com os passos macios?

No fundo, é tudo isso. Talvez nada disso. Quem sabe apenas a nossa própria identificação no outro?

E, se é assim, como alguém pode perder a definição de amor? Como perder algo que está dentro de nós?

Sim, porque sentir amor pelo outro é possuir um amor dentro de si, que se doa ao outro. O outro desperta em nós essa vontade, mas é de dentro de nós que surge o amor.

O problema é que nós idealizamos e antecipamos, em projetos, o amor. Já imaginamos, no primeiro ano de vida em comum, como será cinquenta anos adiante, e vamos, lentamente, passo a passo, construindo essa certeza.
Aí, de repente, se está novamente sem o objeto do amor e se perde o chão. Não porque se perde a definição de amor, mas porque já não se é mais adolescente em busca de um parceiro de sonhos. Já somos adultos com uma bagagem de vida, com boa dose de amargura, decepções e cicatrizes. E, apesar de já possuirmos a plena consciência da maturidade, que se nos foi imposta pelo tempo, atavicamente ainda procuramos, no possível novo alguém, aquele adolescente que encontramos há anos, com as mesmas tolices, as mesmas certezas, planos e afinidades. Esquecemos que já não somos a menina, somos agora a mulher.

É por isso que se tem a sensação de perda de definição do amor, embora o que se perca seja a ilusão de menina, a inocência do amor eterno, o aprendizado de quem nada sabia da vida. Isso não tem volta, e não se acha mais em mais ninguém, nem em nós. Isso era uma coisa só daquela etapa da vida, daquele casal.

Faz-se necessário aceitar as fases da vida, como capítulos de um longo e surpreendente livro, onde somos autores e protagonistas. Tem o capítulo do nascimento, o da infância, da adolescência, do casamento, da maternidade, do mercado de trabalho, das dificuldades em criar filhos, dos filhos adolescentes, do adoecimento dos pais e sua ausência muito sentida, e tem o capítulo das separações e do recomeço. Nesse meio-tempo, o capítulo, não menos importante, das muitas cabeçadas, noites insones, lágrimas incoercíveis e lembranças dolorosas. Tem o capítulo dos Natais e Reveillons de solidão, o das datas marcantes, como de aniversário de namoro, noivado e casamento (onde muitas vezes se contam as bodas disso e daquilo – pura tortura do nosso subconsciente masoquista).

Nossa! São tantos capítulos de ponta-cabeça!

Contudo, há o capítulo da independência, o da vota por cima, o da descoberta da força, por baixo de todas as fragilidades, o do autoconhecimento, o do altruísmo e da bondade. Ué... Mas isso tudo não é amor?

Viu só? Não se perde a definição de amor, pois em tudo o que se faz, se coloca amor. Tudo o que nos cerca, nos locupleta dele. O que precisamos é identificá-lo nas pequenas coisinhas do nosso dia-a-dia, e deixarmos aflorar, para nós mesmos, essa incrível capacidade de amar e perdoar, mesmo àqueles que nos trouxeram esse novo capítulo, do nosso livro da vida, chamado dor.

Eu acredito, piamente, que só podemos começar um novo capítulo, quando conseguimos perdoar. Mas não perdoar da boca pra fora e, por dentro, ainda se remoer de “por que” e “como seria”. Falo de perdoar de verdade, a ponto de torcer para que o outro reencontre seu caminho e consiga prosseguir. Isso é o mais difícil de tudo. E o mais profundo. E é quando se está só, num cantinho do quarto, que se sabe se houve ou não o perdão.

Talvez, quando alcançarmos esse patamar, e só então, tenhamos reencontrado aquela definição de amor perdida lá atrás. Aí, finalmente, é hora de escrever mais um capítulo, que é o “vou ser feliz novamente, de um jeito diferente daquele que já fui um dia, porém não menos grandioso e gratificante”. Até lá, não há o que se assustar com as águas que rolarão, com as olheiras que surgirão, ou com a sensação de vazio. Isso é um percurso comum a todos os que já amaram demais, e com plena definição de cada minuto desse amor.
 
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Publicado por Lílian Maial em 23/12/2010 às 21h54



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